Novo artigo de Demétrius Faustino destaca o aniversário de Campina Grande

CAMPINA GRANDE 160 ANOS

A RELEVÂNCIA DOS TROPEIROS

 

Demétrius Faustino

 

A marca e o maior impulso para o desenvolvimento econômico de Campina Grande começam quando se compreende que grande parte da produção transportada pelos velhos tropeiros poderia ser retida e comercializada localmente, bem como o investimento em máquina de beneficiar algodão, pois isto permitiu que a cidade se transformasse em grande exportadora do “ouro branco”, o que denotou um dos momentos relevantes do aceleramento econômico da “Rainha da Borborema”. Era o abono da facilidade para o escoamento da produção algodoeira, principalmente com a chegada da máquina número 3, da Great Western, quando em 02 de outubro de 1907, foi inaugurada a Estação Ferroviária, com a chegada do primeiro trem.

Goulart (1961), ao mencionar a importância social do tropeiro destaca que este era o telegrafo, o jornal, e o rádio, porque era ele, ao regressar da Côrte, quem levava as notícias mais frescas, eram “os primeiros a dar as últimas” posto que estas, ao serem transmitidas, já levavam obrigatoriamente um atraso de meses. Mas sem a regularidade das viagens das tropas, as populações segregadas nos núcleos interioranos ficariam praticamente incomunicáveis e só poderiam expedir e receber notícias em casos esporádicos. 

De fato, a relevância dos tropeiros para a história social e econômica da antiga Vila Nova da rainha foi tão marcante que não há como desintegrar a dinâmica da cidade com a presença desses agentes econômicos que vinham de todas as regiões do estado, e de estados vizinhos, como o Rio Grande do Norte e o Ceará, carregados com seus fardos de pele e de algodão, a caminho de Goiana e Olinda, no Estado de Pernambuco, importantes mercados de secos e molhados no século XIX.

Inspirados nessa rica história, Raimundo Yazbek Asfora e Rosil Cavalcanti fizeram em parceria, uma das mais belas canções em língua portuguesa, a qual homenageia a segunda cidade do Estado da Paraíba, apesar de nenhum dos autores de “Tropeiros da Borborema” serem Campinenses de nascimento.

Descendente de sírios e libaneses, Raimundo Yasbeck Asfora nasceu em Fortaleza, no dia 26 de novembro de 1930, onde, ainda menino, veio com a família para aquela que seria sua terra de amor e paixão, assim declamada em verso e prosa: Campina Grande. Em 1987, Asfora faleceu tragicamente.

Já Rosil Cavalcanti era pernambucano, nascido no engenho Zabelê em Macaparana, no dia 20 de dezembro de 1915. Formou dupla com Jackson do Pandeiro (Café com Leite), o grande gênio da música regional nordestina, que gravou e imortalizou-se, com canções como “Cabo Tenório”, “Lei da Compensação”, “Quadro Negro” e o clássico “Sebastiana”, entre outras. Rosil faleceu em Campina Grande, em de 10 de julho de 1968.

Para vencer os percalços representados pelo Planalto da Borborema, que na época era até mais conhecido como Serra da Viração conduzindo tropas de burros, precisava ser muito corajoso, pois havia um alto número de acidentes como se sabe, e os tropeiros da Borborema condensaram a coragem singular do povo interiorano em vencer barreira, razão pela qual a imortalidade trazida na eterna composição de Asfora e Rosil tem o atributo de ser apropriada e inédita na homenagem aos grandes almocreves que hoje estão representados em monumento na terra do maior São João do Mundo. Esses almocreves são verdadeiros heróis, e é fantástico ver seu legado sendo honrado dessa forma, especialmente em uma região tão rica em tradições como o Vale do Silício Brasileiro.

Essa canção é uma referência, e tanto é verdade, que reconhece que Campina Grande somente tem a sua grandeza devido à presença dos antigos tropeiros que descobriam pousadas quando rumavam a Pernambuco em tempos não hodiernos, mas que as viagens do tempo não conseguem apagar.

A genialidade desses dois fenômenos extraordinários também foi beneficiada pela voz e pelo talento do Rei do Baião Luiz Gonzaga, que, com sua voz anasalada e inconfundível e talento incomparável, deu vida e imortalidade a “Tropeiros da Borborema”, muito embora só a tenha cantado com o poema original de Raymundo Asfora em dezembro de 1988. Tanto é verdade que em plena Rua 07 de Setembro, em Campina Grande, no dia 08 de dezembro de 1975, Gonzaga, no palco, em alto e bom som pedia desculpas publicamente a Raymundo Asfora por “não ter gravado a letra completa” da canção Tropeiros da Borborema, tal como ele a havia concebido e dado a Rosil Cavalcanti para musicar.

E assim Campina Grande sorrindo, abre as portas da cidade. Ao chegar seja bem vindo, ao partir leve saudade.

João Pessoa, outubro de 2024.