O FIM DO PSDB: DESAPARECIMENTO ANUNCIADO
Demetrius Faustino
Foi-se embora sem estardalhaço, como quem apaga a luz e fecha a porta da própria história. Nenhum estrondo, nenhuma marcha fúnebre partidária. O PSDB — aquele mesmo que já reinou absoluto nos corredores do Palácio dos Bandeirantes, que colocou em circulação a moeda que salvou o país da inflação galopante e se apresentou, anos a fio, como o cérebro da racionalidade liberal no Brasil — sai de cena em 2025 com mais silêncio do que resistência. Desaparece como um quadro retirado discretamente da parede de uma repartição antiga: ninguém protesta, ninguém nota — apenas o espaço vazio denuncia o que já esteve ali.
Não há velório oficial, nem nota de pesar da República. O enterro acontece a céu aberto, em praça pública, com testemunhas dispersas, discursos nostálgicos e um punhado de votos que já não dava nem para eleger síndico de prédio. É um fim sem luto — só constrangimento. Os militantes históricos, que outrora lotavam convenções e discutiam com brilho nos olhos os rumos do país, hoje estão calados, mudados de partido ou simplesmente cansados. Restam fotos amareladas com Fernando Henrique, jingles esquecidos de campanhas vitoriosas e um logotipo que já não representa mais ninguém.
O PSDB, que um dia foi símbolo de articulação nacional, hoje não passa de nota de rodapé em coligações improvisadas. Seu fim não veio por um golpe, nem por um escândalo específico — veio pelo desgaste progressivo de quem passou tempo demais tentando agradar a todos e acabou não representando ninguém.
O partido que já teve Fernando Henrique na Presidência, Aécio no segundo turno e Serra com agenda de ministro some entre alianças mal explicadas, escândalos mal resolvidos e candidatos que desaprenderam a falar com o povo. O tucano, ave discreta, virou metáfora perfeita: elegante, mas cada vez mais raro no habitat eleitoral.
Não faltaram avisos. Desde a implosão moral provocada por gravações incômodas em Minas até o esfarelamento em São Paulo, bastião histórico da legenda, o partido virou sombra de si mesmo. Foi perdendo quadros, espaços, eleições e — o mais fatal de tudo — perdeu o rumo. Tornou-se o que hoje chamam de “partido-ponte”: serve para alguns cruzarem até onde interessa, depois abandonam o barco e seguem viagem em siglas mais úteis — ou mais populistas.
Teve um tempo em que o PSDB era sinônimo de modernização, centro político, moderação racional. Mas a moderação virou omissão, e o centro político virou um lugar deserto entre extremos barulhentos. Enquanto isso, o eleitor cansou de ouvir economês e jargões acadêmicos. Queria arroz, feijão e vacina — e, quando não teve, migrou para onde gritavam mais alto, ainda que prometessem menos.
O partido acaba não por falta de história, mas por falta de presente. E talvez por isso o PSDB tenha morrido sem que muitos notassem. Foi morrendo devagar, entre legendas de aluguel e votos de legenda. Morre de irrelevância.
Hoje, quem ainda lembra do PSDB talvez o faça com uma pontada de melancolia — como quem encontra uma camisa de campanha antiga no fundo do armário e pensa: “Já votei nesses caras.” Só que memória não elege ninguém. E partido que vive só de passado vira sigla de museu.
Fim do PSDB, início de quê? Ainda não se sabe. Porque, quando um partido morre, não é só uma sigla que desaparece — é um modo de pensar, de negociar, de disputar o poder que se esgota.
Quanto à política brasileira, essa sim, segue viva — inquieta, mutante, voraz. Não bastam mais tecnocratas de fala empolada, nem salvadores da pátria com slogans inflamados. O povo quer escuta. Quer alguém que fale sua língua sem ser demagogo, que entenda sua dor sem fazer pose de mártir, que saiba que governar não é apenas uma equação de planilhas, mas uma arte de convivência com as complexidades da rua.
João Pessoa, maio de 2025.