A INFLUÊNCIA DA TECNOLOGIA NA NOSSA FÉ – Novo artigo de Demétrius Faustino

Demétrius Faustino

Era uma vez um mundo onde a fé mudou de endereço. Antes, as pessoas se ajoelhavam nos bancos das igrejas; agora, elas inclinam a cabeça para a tela do celular. Se antes rezávamos para um Deus invisível, hoje seguimos algoritmos onipresentes, que sabem mais sobre nós do que nossa própria mãe. O sagrado se digitalizou, e o que antes era um espaço de contemplação e comunhão passou a ser uma busca frenética por conexão – não necessariamente espiritual, mas, sobretudo, digital.
Não me entendam mal, a tecnologia é um milagre moderno. Nunca foi tão fácil se conectar, aprender e espalhar mensagens para milhares, até milhões, de pessoas com um simples toque na tela. Mas já reparou como ela assumiu um papel quase divino? O Google responde às nossas preces mais rapidamente do que qualquer santo. Basta digitar uma dúvida e, em questão de segundos, temos a resposta. As redes sociais nos garantem a sensação de pertencimento que antes encontrávamos nas missas de domingo. Agora, comunidades se formam em grupos de WhatsApp, fóruns e perfis no Instagram, onde a palavra de influenciadores pode ter mais impacto do que a de um padre ou pastor.
E, claro, há o TikTok, onde os profetas da nova era dançam e profetizam tendências que regem nossos hábitos e opiniões. Como um sermão em movimento, cada vídeo de poucos segundos carrega uma mensagem poderosa – seja de motivação, autoajuda ou até mesmo doutrinas reformuladas para a linguagem da modernidade. Nunca foi tão fácil compartilhar fé, mas nunca foi tão fácil distorcê-la também. A verdade absoluta cedeu lugar ao que é mais compartilhado, e a reflexão profunda foi substituída pelo consumo rápido de conteúdo.
Nosso novo templo tem um Wi-Fi potente e um feed infinito. Em vez de terço, contamos curtidas. Em vez de confissão, desabafamos em tweets que evaporam na nuvem. Em vez de milagres, buscamos viralizar. Os antigos ícones religiosos agora disputam espaço com avatares digitais, e a devoção foi adaptada para caber dentro de um story de 15 segundos. Orações foram abreviadas em emojis de mãos juntas, e a espiritualidade virou um mercado rentável para quem souber captar a audiência certa.
Mas, como toda religião, essa também tem seus perigos. Seguimos dogmas disfarçados de opiniões populares, e aqui a heresia é pensar diferente. O cancelamento se tornou a nova fogueira da Inquisição, e qualquer desvio do discurso dominante pode levar a uma excomunhão digital. O perdão? Raro. A compaixão? Só se render engajamento. Já não basta acreditar, é preciso provar, postar e compartilhar, sob o risco de se tornar irrelevante no universo onde a fé é medida em alcance e engajamento.
Talvez seja hora de lembrar que nem todo seguidor é fiel, nem todo like é amor, e nem toda tendência merece ser seguida. Quem sabe, encontrar um tempo para o silêncio, para o olho no olho, para aquela conexão que nenhuma rede consegue replicar. Porque, no fim das contas, o que a gente realmente busca não cabe em um post de 280 caracteres. A fé, afinal, sempre foi algo que se sente, não algo que se exibe.
João Pessoa, fevereiro de 2025.